Por Giovanni Guerreiro e João Felipe Coelho Viterbo
Exatamente há um ano, o filme “O Homem que Mudou o Jogo” (ou “Moneyball”, no original em inglês) concorria ao Oscar em seis categorias, incluindo Melhor Filme. Perdeu todas. A obra é um retrato fictício da história real do general manager Billy Beane, do Oakland Athletics, que revolucionou o beisebol através do uso da sabermétrica. Desenvolvida pelo historiador e matemático Bill James na década de 1980, a sabermétrica é a análise especializada do beisebol através de estatísticas de jogo, providenciando evidências para responder objetivamente a perguntas como “qual jogador contribui mais para o ataque do time”. Popularizada por Beane e pelo relativo sucesso de Oakland, a sabermétrica tornou-se pioneira no uso coletivo de tecnologia e dados em um esporte. Desde então, os Athletics disputaram os playoffs da MLB (Major League Baseball, a liga de beisebol dos Estados Unidos) seis vezes, mas não alcançam a tão esperada World Series – popularmente conhecida como a final da liga – desde 1990, uma década depois de adotarem o novo método. Ainda que seja difícil contestar a funcionalidade da análise de dados estatísticos, que rendeu sucesso e pioneirismo ao time de Oakland, também é impossível não notar que os troféus não chegaram. A tecnologia, portanto, eivou de dúvidas o mundo esportivo: qual é sua contribuição às modalidades?
Confira os dez anos da sabermétrica
O uso de aparatos tecnológicos na arbitragem varia entre as atividades esportivas. No futebol, sempre que um erro de arbitragem se torna protagonista de um jogo, a questão volta à tona. Horas ou dias depois, no entanto, nada é feito para que o esporte evolua. Paulo César de Oliveira, árbitro de futebol que pertence ao quadro da FIFA, considera a complexidade da questão. “Eu sou a favor da tecnologia, desde que em todos os jogos a gente a utilize. Na Copa do Mundo, poderia se utilizar. Teremos 12 sedes aqui, estádios praticamente com a mesma arquitetura, com toda a condição de se inserir um sistema para fazer este acompanhamento”, afirma. Oliveira, no entanto, encontra um obstáculo: o princípio de isonomia. “No Campeonato Brasileiro eu já não sei se teríamos as mesmas condições. Para ter o princípio de igualdade a gente teria que adotar a tecnologia com a mesma empresa e o mesmo posicionamento de câmera em todos os jogos de um campeonato”, finaliza.
Em dezembro, durante a realização da última edição do Mundial de Clubes da FIFA, a entidade máxima de futebol realizou testes com um sistema que apontava se a bola cruzaria ou não a linha do gol. O presidente Joseph Blatter aprovou – mas avisou: quer o mesmo recurso durante a Copa das Confederações, que acontece entre os dias 15 e 30 de junho, no Brasil. Já Michel Platini, presidente da Uefa (União das Federações Europeias de Futebol), não esconde seu descontentamento relativo às mudanças no futebol: é contra as medidas de Blatter. A International Board, instituição que define as regras a serem utilizadas na prática do futebol, vai debater o assunto. Uma decisão favorável ao uso da tecnologia daria o caráter histórico ao Brasil de sediar a primeira Copa do Mundo com recursos tecnológicos para auxiliar as decisões do árbitro, fato muito comum em outros esportes populares praticados em todo o mundo.
Competições como as da NFL (National Football League, a liga de futebol americano), NBA (National Basketball League, a liga de basquete), ou nos mais importantes torneios profissionais de tênis, a utilização de recursos tecnológicos para auxiliar árbitros a tomarem decisões já é ingrediente imprescindível. A NBA, por exemplo, começou a utilizar a repetição dos lances duvidosos a partir da temporada 2002-2003 e, desde então, vem ampliando suas possibilidades de uso. Atualmente, os árbitros podem, a qualquer momento, consultar televisores presentes nas quadras para confirmar irregularidades.
No tênis, o controle do uso da tecnologia está nas mãos do jogador. Em cada set, os atletas podem pedir duas revisões de jogada com o objetivo de confirmar se ganhou – ou perdeu – o ponto. Caso a decisão do árbitro esteja correta, o atleta perde uma das revisões. Se o jogador estiver certo, mantém o direito a mais dois pedidos ao longo do set que está sendo disputado. Recentemente, a Comissão Europeia de Vôlei usou dos mesmos recursos do tênis para tentar mudar a prática do esporte.Na NFL, os árbitros também podem consultar os replays a qualquer momento quando há dúvida, e os treinadores podem desafiar decisões da arbitragem duas vezes em cada tempo – mas se estiverem errados, perdem um tempo técnico.
A tecnologia, contudo, nem sempre é uma aliada. Mesmo nas modalidades em que é parte integrante de uma partida, os erros seguem acontecendo. “Há lances interpretativos que a própria tecnologia não nos auxilia”, afirma Oliveira. Outro ingrediente nada desprezível é o uso dos dispositivos com conexão à internet no próprio estádio, como smartphones e tablets. “Hoje, a informação é instantânea. O torcedor na arquibancada já vê as imagens e, na seqüência, produz ofensas aos árbitros”, explica.
Apesar de certo conservadorismo por parte de dirigentes e comandantes de esportes, recursos tecnológicos quase que imperceptíveis chegam paulatinamente a outros esportes, como roupas com tecidos inteligentes, chuteiras que facilitam a corrida, entre outros adereços que já são realidade – na forma de análise de dados. O basquete – além do beisebol – possui uma métrica própria, a APBR (Associação para Pesquisa de Basquetebol Profissional), mas que ainda não se popularizou como a sabermétrica. Mesmo esportes movidos a estatísticas, como o futebol americano, ainda não possuem um estudo matemático do tipo.
No futebol, um esporte com menos olhares estatísticos, isso se inicia com a popularização da coleta de dados. Recentemente, um serviço de análise de informações de jogadores vem chamando atenção de clubes e seleções européias. Manchester City, Real Madrid, Chelsea e até mesmo os selecionados francês e italiano aderiram ao o OptaPro, funcionalidade de precisão que permite avaliar todas as informações – em estatísticas – dentro de campo. A ferramenta, paga, desembarca nos próximos meses em solo sul-americano, quando vai acompanhar o Campeonato Brasileiro. Paulatinamente, a tecnologia – e a montanha de dados – toma seu espaço no mundo esportes. Alguns vão adotá-la, outros não. O importante é saber até que ponto ela pode chegar. Sozinha, a lugar algum. Integrada a um sistema, com equipe especializada, é possível ir longe. Quem sabe, até lá, o time de beisebol Oakland Athletics levante alguns troféus.